quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Prefiro não ler o teu fim!



A tua voz não se ouvia pai,
Não a encontrei na minha infância,
Fez-me falta.
Li a tua voz algumas vezes
Nas cartas que escrevias
Como se vivesses do outro lado do mundo
E afinal vivias apenas no teu quarto,
No teu refúgio.
Como me revoltavam as tuas cartas
Fossem elas um poema de amor
Ou uma reprimenda de pai,
Como queria que fosses capaz de falar, pai.
Como queria ter tido a coragem
De quebrar o nosso silencio.
Tanto tempo perdido, pai.
Quando te ouvia falar em público

Sentia que não te conhecia,
Que os outros te conheciam melhor que eu,
E sentia-me triste, perdida,
Esquecida na minha incompreensão.
Porque eram capazes de te enaltecer,
E eu não!
De reconhecer as tuas qualidades
orador… poeta… artista…
De pessoa sensível… humana!
De tudo o que hoje sei que és…
Por vezes confundi as tuas qualidades
Com arrogância e vaidade…
Hoje sei que era apenas a tua luz que me ofuscava.
Mas o nosso amor está destinado ao silêncio pai.
Quando a vida se tornou turbulenta o suficiente para o quebrar…
Quando a vida nos fez acordar…
Para falarmos de nós, para eu te conhecer melhor…
Voltaste ao teu silêncio pai…
Ao teu eterno silêncio!
Serás sempre uma quimera…
E mais uma vez deixaste uma carta para mim…
Perdoa-me pai… não a li!
Estava escrita há demasiado tempo
Desde o tempo em que estavas só
no teu mundo impenetrável,
Desde o tempo em que tínhamos as portas fechadas por dentro,
E as janelas cerradas por medo da liberdade,
Por medo de sermos felizes!
Não a li…
Hoje prefiro o teu eterno silêncio
a palavras escritas num papel desbotado pelo tempo…
Não quero regressar!
Prefiro fechar os olhos
E rever o teu rosto a sorrir para mim
Escutar o que ainda dissemos, por fim…
Prefiro amar-te em silencio…
Prefiro não ler o teu fim!



ana claudia albergaria
25.02.2009

1 comentário:

Anónimo disse...

Gostei muito do poema ao teu pai...Amor de filha e pai... às vezes incompreendido, mas sempre sentido...