segunda-feira, 2 de maio de 2011
No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.
Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!
O que eu sou hoje é como a humidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas
lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!
Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...
15/10/1929
Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)
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5 comentários:
Cláudia, se o meu abraço ajudar a dar sentido a todos os dias e em especial e este, receba-o. É de coração.
Viver é uma caminhada por vezes solitária mas sempre - assim a vejo - como provação em busca da luz. Pelo caminho ficam tantos dos que um dia amámos, e, contudo, sabemos que partindo estão connosco...
Feliz aniversário!
Beijo
Mel
Hoje
Com carinho e admiração,
Agora mais do que nunca
Eu não me esqueço de ti.
Um dia entenderás
O quanto és especial.
Mesmo estando longe de ti.
PARABENS
Mereces tudo de bom na vida
Beijo com carinho
oi. tudo blz? estive por aqui. muito legal o texto. gostei. apareça por lá. abraços.
Ana na tua tela colorida encontra se o tempo,horizontes recordações
Como este lindo poema de Fernando Pessoa ,Alvaro de Campo
Relembrando a caminhada da vida
Deixo na tua tela gravada com carvão e em tons de pastel o meu carinho sentido parabens
Anita de Castro
Ana, os meus parabéns atrasados.
Beijinhos.
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